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filocriatividade | #filocri

filosofia para/com crianças e jovens | mediação cultural e filosófica | #ClubeDePerguntas | #LivrosPerguntadores | perguntologia | filosofia, literatura e infância

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28 de Dezembro, 2023

dar um passo em frente perante o abismo

joana rita sousa / filocriatividade

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"Vá lá, então."

"Dá lá a resposta."

"Diz qualquer coisa, tu sabes."

"Vá, estamos à espera."

 

Estas são algumas das expressões que oiço quando estou a fazer oficinas de filosofia com crianças ou jovens. Oiço estas expressões da parte de alguns professores e de algumas professoras que, desta forma, apressam as crianças para dizer alguma coisa. Note-se que não oiço sempre, em todas as oficinas. Ainda assim, gostaria de pensar um pouco sobre estas atitudes e expressões e de como podem ser um obstáculo à escuta. 

 

[Escutamos verdadeiramente?]

As oficinas de filosofia e de diálogo assentam num compromisso para pensar e investigar alguma coisa em conjunto. As oficinas vivem do pensamento colaborativo e assentam na prática da escuta. Escutar parece ser algo banal, de todos os dias. Será que prestamos atenção a essa escuta?

Nas oficinas procuro modelar uma atitude de escuta e de atenção às palavras de cada pessoa que participa. Porém, não falamos o tempo todo, pelo que essa atenção também deve cuidar do silêncio e do tempo que cada pessoa precisa para pensar. Cada pessoa terá o seu ritmo de pensamento e, como estas oficinas não são um concurso televisivo onde há 30 segundos para responder, é preciso respeitar esse ritmo de pensamento. Há quem pense em voz alta e comece a arriscar o pensamento com palavras; há quem pense em silêncio.

 

[Como praticar a escuta?]

É difícil explicar como praticar a escuta. Começo por dizer: fale menos e escute mais. Mas depois o aluno diz coisas de forma atabalhoada e queremos corrrigir. Ou não alinhou bem o tempo da frase. Ah, pior, está a dizer uma coisa errada. Ou então está a demorar muito a dar a resposta. Quando damos conta estamos a interromper ou falar por cima ou até a apressar uma resposta por parte do aluno ou da aluna.

O risco de deixarmos a criança falar sem interromper traduz-se em abdicar de tempo que poderia ser preenchido com outras coisas que o/a professor/a considera importante.

Numa oficina de filosofia a vez e a voz é distribuída o mais possível por todas as pessoas que decidem participar.  Uma das primeiras atitudes que menciono como fundamental para o desenvolvimento das oficinas é não ter pressa. Dito de outra forma,  dar tempo para que o pensamento aconteça. 

Defendo que as pessoas adultas na sala devem procurar modelar a escuta. Isso implicar estar perante uma espécie de abismo (o tempo do silêncio de que a criança precisa para pensar e depois falar) e dar um passo em frente.

Numa oficina de filosofia surgem perguntas, respostas, ideias inesperadas. Procuramos pensar as coisas pela primeira vez, num exercício de espanto. A incerteza faz parte deste processo de resolução da opacidade (António de Castro Caeiro).