«A voz das crianças e dos jovens na educação escolar»
o Conselho Nacional de Educação publicou em Diário da República (n.º 135/2021, Série II de 2021-07-14) uma recomendação sobre a voz das crianças e dos jovens na educação escolar.
Entendemos por "voz das crianças e dos jovens na Educação Escolar" a possibilidade e o direito das crianças e dos jovens terem oportunidade para exprimir as suas ideias e opiniões ao longo de todo o processo educativo, bem como de verem a sua participação ser respeitada e considerada em todas as opções que lhes digam respeito.
Referimo-nos a várias dimensões transversais da voz: como instrumento de interação, de participação, de apropriação do conhecimento e de empoderamento social, promotores de desenvolvimento humano e de afirmação de cidadania.
Não basta apenas ouvir a voz do aluno. Os professores têm um imperativo ético de fazer algo a esse propósito com os alunos, e é por isso que o envolvimento significativo dos alunos é vital para a melhoria da escola. (Fletcher, 2005)
o documento reconhece que não tem havido uma prática de escuta por parte da comunidade escolar adulta perante as vozes das crianças e dos jovens:
Ouvir e considerar as opiniões dos/as alunos/as não tem sido uma preocupação frequente entre os profissionais de educação. Nas suas formas mais tradicionais, a escola desenvolveu uma cultura de transmissão de conhecimentos de sentido único: da escola para os alunos/as, com reduzidas possibilidades de acolher as suas intervenções.
ainda que não tenha elementos estatísticos para partilhar consigo, a verdade é que a minha experiência itinerante com a filocriatividade, que me tem feito viajar e conhecer diferentes escolas por todo o país, tem-me dado a conhecer escolas muito diversas. escolas onde essa escuta acontece e tem consequências (por exemplo, é implementada uma sugestão de uma criança) e escolas onde a escuta acontece, sem consequências e escolas onde se ouve, mas não se escuta.
devo dizer também que uma mesma escola pode albergar estilos diferentes, pois cada sala é uma realidade em si mesma.
voltarei à reflexão sobre este tema, nos próximos tempos, pois o documento merece uma leitura dedicada e demorada. além disso, gostaria de fazer uma leitura acompanhada com alguns dos pensadores e pensadoras da filosofia para / com crianças e jovens, no sentido de compreender como é que esta área filosófica se constitui como um espaço de escuta de todas as vozes do grupo, indepentemente da sua idade:
A igualdade e o equilíbrio cognitivo entre todos os membros procuram materializar-se na própria ideia de comunidade. As perguntas filosóficas são feitas em comunidade, o que significa que não são dirigidas ao professor ou a outra figura tutelar do conhecimento, mas a quem está presente. Num espaço preferencialmente em círculo, em que não há posições físicas de destaque porque todos se sentam ao mesmo nível, fala-se no grupo, com o grupo e como um grupo. Isso não significa uma homogeneidade ou consenso permanente de posições. Antes, é sinónimo de construção de um espaço partilhado de vozes múltiplas que se tocam em confrontos e concordâncias. Cada um partilha ideias que, começando por serem suas, são colocadas no espaço comum do diálogo e da reflexão. Não é o professor que pergunta o que já sabe, aguardando que os alunos se juntem a ele num caminho trilhado e sem surpresas. São todos, professor e alunos, que acolhem filosoficamente as suas perguntas e procuram descobrir-lhes sentidos, detetar inconsistências, colocar hipóteses, matizar sentidos e até encontrar o seu irredutível incómodo. (Magda Costa-Carvalho)