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19 de Julho, 2022

o que é o lugar de fala?

joana rita sousa / filocriatividade

[a partir da leitura do livro Lugar de Fala, de Djamila Ribeiro e da reflexão de Evelyn Lima (INÉF)]

 

o que é o lugar de fala?

no capítulo "O que é lugar de fala?" Djamila Ribeiro do sentido dado pela Comunicação que "serviria para analisar que o lugar de fala da imprensa popular seria diferente do lugar de fala do que eles chamam de jornais de referência (...)" (p. 56) 

Ribeiro alerta para a necessidade de entendermos a palavra discurso de forma ampla: não se trata somente de a emissão de um posicionamento, usando palavras, mas sim de um "sistema que estrutura determinado imaginário social, pois estaremos falando de poder e de controle". (p. 55) o entendimento de discurso deriva da noção de Foucault: 

Suponho que em toda a sociedade a produção do discurso é ao mesmo tempo controlada, selecionada, organizada e redistribuída por certo número de procedimentos que tem por função conjurar seus poderes e perigos, dominar seu acontecimento aleatório, esquivar a sua pesada e temível materialidade. (A ordem do discurso, pp. 8-9

Lima sublinha ainda a ideia da autoridade de quem emite uma informação, remetendo para o texto de Ribeiro onde a pensadora parte precisamente da ideia de lugar de fala no meio da Comunicação. a filósofa co-fundadora da escola Isto Não É Filosofia apresenta o lugar de fala como" a visão de que cada discurso emitido parte de uma localização social". 

o que é que isso significa? 

partir de uma localização social implica ter em conta que "nenhuma visão ou afirmação é neutra, nenhuma visão ou afirmação é universal e que nenhuma visão ou afirmação é descolada de uma posição social, da classe, raça ou género". 

quando eu falo parto de um ponto de vista que ocupa um certo tempo na história, um certo tempo na sociedade. o reconhecimento de que certos grupos foram desumanizados e desconsiderados, compreendemos que os seus pontos de vista na história não colheram legitimidade. 

 

o que não é lugar de fala?

para este ponto recorro à partilha que a escola Isto Não É Filosofia fez na sua conta de instagram, assinada pela professora Evelyn Lima. 

Lima diz-nos que lugar de fala:

"não é um conceito sobre liberdade de expressão; não é um conceito que defende que apenas quem "viveu algo na pele" pode falar sobre o assunto; não é um conceito que restringe a autoridade sobre um assunto à experiência vivida (exemplo comum: só negros sabem e podem falar sobre racismo); não é um conceito que defende que quem não vive uma determinada realidade (exemplo: homens) não pode falar ou ir contra algum assunto dentro dessa realidade (exemplo: homens falarem sobre desigualdade de género). 

 

porque importa saber o que é lugar de fala? 

do meu ponto de vista, saber o que é luga de fala é fundamental para a prática da honestidade intelectual. tenho consciência de que não falo de modo neutro, a minha fala é parcial e parte de um local específico da sociedade, que não é universal. daí decorre, segundo Evelyn Lima, que "cada fala desconsidera outras posições sociais. Você pode falar sobre qualquer assunto desde que saiba que você fala dentro do escopo que está inserido". 

Ao promover uma multiplicidade de vozes o que se quer, acima de tudo, é quebrar com o discurso autorizado e único, que se pretende universal. Busca-se aqui, sobretudo, lutar para romper com o regime da autorização discursiva. (p. 69)

atender ao conceito de lugar de fala é uma postura simultaneamente epistemológica e ética: passa pelo reconhecimento de que não há neutralidade na minha fala sobre o mundo, por alargar a roda de pensamento para outros saberes que, tal como os meus, são localizados e por romper com o silêncio que um discurso dominante calou ao longo dos tempos. 

 

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📷 Jon Tyson / Unsplash

 

quem tem lugar de fala?

o último capítulo do livro é bastante claro: "Todo mundo tem lugar de fala". 

*

(*) o livro Lugar de Fala está publicado na colecção Feminismos Plurais, coordenada por Djamila Ribeiro - editora Jandaíra (2020).

(**) a análise da Evelyn Lima está disponível num dos destaques do perfil instagram da escola Isto Não É Filosofia.  

19 de Julho, 2022

#LERePENSARcom

Febre no Estádio, Nick Hornby

joana rita sousa / filocriatividade

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sugestão do Luís Cristóvão, comentador, de Torres Vedras

o livro:

Febre no Estádio, de Nick Hornby (editorial Teorema)

 

a citação:

"O meu pai e eu estávamos prestes a encontrar o equivalente inglês perfeito. As tarde de sábado no norte de Londres deram-nos um contexto em que podíamos estar juntos. Podíamos conversar quando queríamos, o futebol fornecia-nos assunto de conversa (em todo o caso, os silêncios não eram opressivos), e os dias tinham uma estrutura, uma rotina. O Estádio do Arsenal viria a ser o nosso relvado (e, sendo um relvado inglês, olhávamos geralmente para ele com ar pesaroso através de uma chuva vigorosa); o Gunner's Fish Bar em Blackstock Road era a nossa cozinha; e o West Stand a nossa casa. Era um cenário maravilhoso, e mudou as nossas vidas precisamente na altura em que elas precisavam mais de mudar".

 

a reflexão:

O futebol enquanto elo de ligação sempre foi algo que me fez imenso sentido. Na profunda ligação que criei com o meu pai através das experiências de ir ao futebol ou de estar em casa a ver futebol. De como isso acabou por se transformar numa estrutura à volta da qual organizei, quase sempre a minha vida. Numa linguagem que se transformou numa língua franca para falar com qualquer pessoa, em qualquer lugar (o meu avô materno não gostava de futebol e, de alguma forma, assustava-me chegar a velho e não ter uma coisa sobre a qual falar quando entrasse num café cheio de caras estranhas). No livro do Nick Hornby, ao qual regresso por estes tempos, está lá tudo isso e muito mais. Como uma coisa que não temos bem a certeza de ter escolhido, mas precisamente o contrário, uma coisa que nos escolheu a nós, para se oferecer como ponte para sairmos de um mundo pessoal que nos parece demasiado fechado para sobrevivermos.

 

a pergunta: 

Se não fosse através do futebol, como é que eu teria chegado a viver algo semelhante a isto?

 

👉 #LERePENSARcom é uma rubrica #filocri que pretende divulgar leituras, leitores, reflexões e perguntas. pretende-se também ampliar o entendimento de leitura: podemos ler e pensar com livros (literatura,  filosofia, ciência, álbuns ilustrados...), com documentários, com imagens ou com jogos e até com séries. procura-se aquilo que nos faz pensar, pratica-se o voltar a pensar e termina-se (se bem que o fim é um começo) com uma pergunta.  

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