[uma reflexão a partir do livro A Arte de Fazer Perguntas, de W. Berger, publicado pela editora Vogais]
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o papel fundamental da ignorância
perguntamos pois percebemos que não sabemos. temos consciência da nossa ignorância:
“é uma forma de consciência mais elevada que não só nos separa do macaco, como também separa a pessoa inteligente e curiosa do idiota que não sabe nem quer saber.” (p. 27)
a pessoa perguntadora está disponível para sentir confiança quanto toma consciência da sua ignorância. a pergunta é uma ferramenta que nos permite aprofundar essa ignorância, mergulhar nela para podermos voltar à superfície com mais clareza, com algo que entretanto descobrimos e sobre o qual já não somos assim tão ignorantes.
pensamento divergente e perguntas
Berger refere o neurologista Ken Heilman e estudos neurológicos sobre o pensamento divergente, “o processo mental que tenta levar às ideias alternativas.” de acordo com o neurologista existe uma ligação entre o pensamento divergente e o “e se eu pensar em X de outra forma”. por esta razão, Berger defende que o pensamento divergente é uma forma de fazer perguntas.
o que pode uma pergunta? segundo Berger, as perguntas abrem ou ampliam o pensamento e também têm o papel de nos focar ou orientar.
como?
considere vários passos no acto de perguntar. um “e se...?” tem esse efeito de me fazer procurar por outras formas de fazer o mesmo, alternativas, hipóteses. mas uma pessoa perguntadora tem um problema para resolver e por isso utiliza as perguntas, no momento posterior, para focar e direccionar o pensamento.
a pergunta permite aprofundar o problema, tomar consciência da sua complexidade e, a partir daí, começar a trabalhar na solução, dividindo o problema em partes simples, o que nos ajuda a gerir a complexidade.
trata-se de um processo semelhante ao que Edward de Bono advoga com o uso do chapéu verde (criatividade): este tem um tempo específico e depois precisamos de outras linhas de pensamento (outros chapéus) para orientar o passo seguinte do pensamento.
em suma:
- perguntar exige humildade, para reconhecer que sou ignorante, que me falta saber algo.
- perguntar exige confiança para expor essa ignorância perante os outros.
fazer uma pergunta é, simultaneamente, um acto humilde e corajoso.
a fórmula de Berger
“Estar disposto a fazer perguntas é uma coisa; perguntar bem e com eficácia é outra.”, diz Berger na p. 30.
é preciso ter em conta a fórmula do perguntar – um “porquê?” pede explicação e aprofundamento; o “e se...?” leva-me a explorar hipóteses; o “como...?” exige que partilhe um caminho, uma forma de fazer algo. são perguntas abertas, porém exigem que se lhes dedique tempo e consideração na resposta. são perguntas que accionam o pensamento divergente.
depois há ainda o tom da pergunta. Berger dá um exemplo: entre um “Ó meu deus, o que é que vamos fazer?!” ou um “e se esta mudança representa uma oportunidade para nós?” – a última pergunta tem um tom mais positivo e, segundo o autor, pode conduzir a melhores respostas.
a pessoa perguntadora tem menos receio da mudança e da incerteza: “(...) se nos sentirmos confortáveis a fazer perguntas, a experimentar e a interligar as coisas, a mudança já se tornará uma aventura. E se a pudermos ver como aventura, já estaremos lançados.” (John Seely Brown citado por Berger, p. 44).
além da ignorância, da humildade, da confiança, do conforto perante a mudança, a pessoa perguntadora está mais disponível para inovar. porquê? a razão prende-se com o facto da pessoa perguntadora perguntar porquê, procurando perceber o que falta, identificando e descobrindo problemas.
“(...) se procurarmos problemas existentes nas nossas vidas antes de eles se tornarem óbvios, antes de atingirem uma fase de crise, podemos detecá-los a tempo e tratar deles enquanto ainda oferecem as melhores oportunidades para a melhoria e a reinvenção.” (p. 47)
eis a fórmula de Berger, baseada na sua observação de como as pessoas perguntadoras lidam com problemas:
Perguntar + Acção = Inovação
“A pessoa encontra uma situação que é menos do que ideal, pergunta Porquê?
A pessoa começa a ter ideias para possíveis melhorias / soluções, com ideias que normalmente progridem sob a forma de possibilidades E se?
A pessoa opta por uma dessas possibilidades e tenta aplicá-la; na maior parte dos casos, isto envolve a tentativa de calcular Como?” (p. 48).
”O que separa os pensadores inovadores dos restantes é a sua capacidade – na maior parte dos casos nascida da persistência e da determinação – de dar forma às suas ideias e torná-las reais.” (p. 55)
”Cada “resposta” a que chegam [as pessoas perguntadoras] traz-lhes uma nova vaga de perguntas. Continuar a perguntar é, para eles, tão natural como respirar. Mas como é que ficaram assim? E porque é que não há mais gente como eles?” (p. 57)
e por aí? considera-se uma pessoa perguntadora? partilhe nos comentários!