"estou há cinco aulas a tentar responder a esta pergunta", dizia-me uma pequena-grande-filósofa do alto dos seus 7 anos.
mal sabe ela que esta pergunta incomoda e inquieta muita gente há uns dois mil e muitos anos... :)
a investigação desta aula aconteceu em torno da filosofia em si mesma, algo que os meninos ainda estão a descobrir. como? pela experiência. de aula para aula, os grupos têm vindo a revelar que sentem aquilo que é diferente nas aulas de filosofia, face às outras aulas que têm.
"esta aula é só perguntas, perguntas e mais perguntas", dizia-me a I., há dias.
a pouco e pouco, os meninos vão sentindo segurança e percebendo que nestas aulas se vive um espaço de liberdade e de autonomia, onde podemos dizer o que pensamos, concordar, discordar - e nem por isso deixamos de ser amigos uns dos outros - apresentar ideias diferentes, imaginar "como seria se"... e se há quem sinta desconforto perante isto, outros usufruem deste processo até ao tutano. e querem mais.
"eu detesto as aulas de filosofia", dizia-me o P. olha, P., eu às vezes também não gosto muito. mas a vida tem coisas das quais gostamos mais, outras das quais não gostamos tanto. não é meu intuito que os meninos saiam da aula apaixonados pela filosofia (como eu estou, confesso!); é meu intuito que os meninos saiam das aulas com a curiosidade (ainda mais) aguçada e com vontade de olhar à sua volta e fazer perguntas, revelando assim o que "os incomoda", o que lhes agrada, o que não gostam, o que querem fazer. revelando a sua visão do mundo - que é única. somos todos diferentes, sabiam?
"nas tuas aulas podemos escolher coisas. e às vezes acontecem coisas aqui, diferentes das outras aulas, porque tu deixas-nos ser diferentes. somos todos diferentes! e tu és uma professora diferente!"
há ainda muitos preconceitos em relação à filosofia para crianças. começa pela questão dos "conteúdos" das aulas. e depois as "avaliações" - tema muito polémico no que às AEC' (actividades de enriquecimento curricular) diz respeito.
em conversa com uma amiga e colega que trabalha na área, falamos do desempenhos dos "bons e maus alunos" nas aulas de filosofia: "normalmente, os alunos estão habituados a estudar (alguns literalmente a "marrar"), alguns são diariamente acompanhados pelos pais, com vista a obterem sucesso. quando se trata de filosofia, o que acontece é que eles não têm, de facto, matéria para estudar e isso é muito complicado para os ditos bons alunos, para os pais e, inclusivamente para os professores titulares. estes alunos aprendem a reproduzir e, como diria o Oscar Brenifier, a responder como os professores querem que eles respondam... não estão habituados a questionar, a interrogar-se e a explorar outras possibilidades."
isto de estar no terreno, a colocar a filosofia em prática, vai muito para lá das quatro paredes da sala de aula. é ser consequente na prática do diálogo, no questionar, defendendo as metodologias e esclarecendo quem as estranha - na esperança de que as possa entranhar.